Vontade de Deus, paraíso meu



(Por Rodrigo Damasio)

"Ninguém consegue ter consciência plena da essência última de outro ser humano sem amá-lo. Por seu amor a pessoa se toma capaz de ver os traços característicos e as feições essenciais do seu amado; mais ainda, ela vê o que está potencialmente contido nele, aquilo que ainda não está, mas deveria ser realizado"
Viktor Frankl

            Irmãos e irmãs, a paz de Cristo!
          O tema que vamos adentrar hoje é um que pode ser bastante problemático se visto pelos olhos do mundo e por isso acho válido refletirmos. Quem já começou uma caminhada na Igreja ouviu e ouve falar constantemente da vontade de Deus, desse caminho de realização plena do homem, mas acho que tantas vezes quanto ouvimos falar dela, já questionamos a nós mesmos sobre a maneira como as coisas acontecem em nossas vidas, sobre o rumo dos nossos caminhos, e principalmente, o porquê de seguir algo que pode muito bem ser contrário ao que eu quero. Todas essas perguntas são válidas, mas a resposta acerca da vontade de Deus é sempre a mesma.
        Hoje, acho que todos nós podemos dizer que vivemos num mundo bastante individualista, não só isso, hostil a qualquer desejo que não seja o nosso próprio. Muitas vezes somos educados desde pequenos a fazer os nossos caminhos, a fazer o que quer que seja que nos faça felizes, a tolerar toda a escolha do outro que o faça feliz, e a lutarmos para fazer valer as nossas vontades sem deixar que qualquer coisa ou pessoa interfira nas minhas escolhas ou no que quero ser ou fazer. Esse mundo também é marcado essencialmente por um abismo de indiferença entre os seres humanos isolados nas ilhas de suas vidas individuais, por gritos de pessoas e grupos por mais liberdade, mais expressão, e a hostilização de tudo que seja contra o que quero ser. Não acho que possamos dizer que o amor seja a lei que governa, concorda?
            Adentremos um pouco na frase do Dr. Viktor Frankl que eu coloquei acima. A ausência de amor em que vivemos gera uma situação onde não há entendimento e conhecimento dos seres humanos por conta da falta da compreensão da essência. Sem amor nós julgamos as aparências enquanto no amor buscamos essências. Somente através da lente do amor é que se pode enxergar a essência do homem e perceber a realização do seu potencial. No mundo onde vivemos, o que se busca é a aceitação do que é aparente e não a busca do que é real. O mundo se contenta em olhar a sua aparência e desenvolver leis e conceitos a partir disso, e a isso nos conformamos muitas vezes, seja por buscar legitimação para aquilo que queremos fazer ou ser, seja por medo de se confrontar com a verdade. E se eu aceito viver de coisas que são aparentes, eu me defendo de qualquer coisa que seja real ou que me tire do conforto das minhas aparências e vontades, afinal, o que vale é o que eu quero, não é?
            No meio desse mundo e dessa vida, nós construímos uma identidade, planos, sonhos, relacionamentos, tantas vezes sem saber se estamos construindo a verdade ou apenas mais uma aparência, mais uma ilusão de satisfação e liberdade. Mas aí entra o encontro com a vontade de Deus. O encontro com a vontade de Deus é esse olhar que Frankl descreve: o olhar amoroso que vê a essência. Deus é aquele que antes de toda a eternidade, já dizia nosso nome (como fez em Isaías 49, 1) e nos conhecia, que vê em nós tudo que somos e que podemos ser. Mas sem a compreensão do amor, é impossível compreender a racionalidade de uma vontade que não seja a minha.
Exemplo disso é quando entramos na Igreja, quem nunca escutou “ah, mas a Igreja não deixa você beber”, “a Igreja proíbe você de ir para a festa” ou mais comumente “a Igreja lhe reprime! Você é alienado”. Meus irmãos, eu só posso rezar por esse mundo que é o verdadeiro alienado, alienado da existência de um amor verdadeiro, carente de essências e contente em ilusões. Mas ainda assim, nós nos questionamos o porquê de uma vontade que não é a minha, de leis nas quais eu não votei e de líderes distantes poderem influenciar a minha vida. Porque precisa ser o que Deus quer se o que eu quero não é errado? Porque eu não posso saber de uma vez por onde estou indo? São muitos questionamentos (que eu mesmo já me fiz incontáveis vezes) e que só encontram respostas no encontro verdadeiro com o amor de Deus.
Ao contrário de uma vontade que é essencialmente imposta, traçada por um olhar externo e colocada de encontro com a nossa, a vontade de Deus vem de um olhar de dentro, um olhar que perfura a alma e nos conhecer por inteiro, busca para nós não a mediocridade das imagens, mas a plenitude da nossa verdade. A vontade de Deus não é algo que brota da arbitrariedade, mas do amor, do mais puro e completo amor. Esse amor nos deixou o caminho da Igreja com a moral e a doutrina, esse amor toca os nossos corações nas orações, pregações, e nos inspira no Espírito aos caminhos que irão nos realizar plenamente, indo de encontro não ao meu imaginário, mas penetrando a minha essência.
Nós é que tantas vezes apegados às nossas imagens, aos nossos conceitos de liberdade e verdade, aos nossos planos não entendemos, e nos debatemos contra algo que busca nada mais do que a nossa felicidade, a plenitude do nosso ser. Nós que temos uma visão não entendemos quando Deus nos diz “Assim como os céus são mais altos do que a terra, também os meus caminhos são mais altos do que os seus caminhos e os meus pensamentos mais altos do que os seus pensamentos.” (Isaías 55:9). Nós não nos conformamos com a lei de Deus porque falhamos tantas vezes em compreender, depois de tantos anos de pecado, que ela nada mais é do que a verdade mais íntima circunscrita no meu coração, a minha própria natureza.
Com isso tudo que expus irmãos, eu tenho apenas um convite. Não tenhamos medo de abraçar a vontade de Deus, seja ela qual for e seja qual for os caminhos. Não tenhamos medo de nos afastar das nossas velhas imagens para abraçar a nossa essência que se encontra nessa vontade de amor. Nunca será fácil, o mundo (e muitas vezes até seus próprios pensamentos) irão propor outros caminhos, outras vias, mas somente o amor vê a essência e é caminho, verdade e vida (Jo. 14, 6). Se abandone, escute a voz do amor que lhe chama a uma vida nova, a novos caminhos, caminhos de amor e de felicidade, e não tenha medo de se render. Ele, o seu amado, olha com o amor de quem sabe quem você é e pode ser. A Ele pertence o seu presente e futuro, e na vontade d’Ele reside a sua verdadeira felicidade.
Que nesse mundo de aparências e ilusões nós possamos cada vez mais ser cientes da vontade de amor que nos chama à essência e a plenitude, ao amor e a felicidade verdadeira. Não tenhamos medo de seguir o amor e de dizer diariamente o nosso sim!

Doce mistério, cruz e ressurreição
Alegria sem fim
É dor incomparável
é paz profunda em mim
Tua vontade

Jugo suave, chaga que cura
Violência que me faz livre
É caminho certo de felicidade enfim
É amor de Deus

Paraíso, meu lugar seguro
onde vou descansar
Purifica minh'alma
e assim renova o meu amar

Tua vontade em mim é como
um tesouro em vasos de argila
Verdadeira paz que o tempo
e a dor não poderão roubar
(Tua Vontade – Suely Façanha)

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