"Ninguém consegue ter consciência plena da
essência última de outro ser humano sem amá-lo. Por seu amor a pessoa se toma
capaz de ver os traços característicos e as feições essenciais do seu amado;
mais ainda, ela vê o que está potencialmente contido nele, aquilo que ainda não
está, mas deveria ser realizado"
Viktor Frankl
Irmãos
e irmãs, a paz de Cristo!
O tema que vamos adentrar hoje é um
que pode ser bastante problemático se visto pelos olhos do mundo e por isso
acho válido refletirmos. Quem já começou uma caminhada na Igreja ouviu e ouve
falar constantemente da vontade de Deus, desse caminho de realização plena do
homem, mas acho que tantas vezes quanto ouvimos falar dela, já questionamos a
nós mesmos sobre a maneira como as coisas acontecem em nossas vidas, sobre o
rumo dos nossos caminhos, e principalmente, o porquê de seguir algo que pode
muito bem ser contrário ao que eu quero. Todas essas perguntas são válidas, mas
a resposta acerca da vontade de Deus é sempre a mesma.
Hoje,
acho que todos nós podemos dizer que vivemos num mundo bastante individualista, não só isso, hostil a qualquer desejo que não seja o nosso próprio. Muitas
vezes somos educados desde pequenos a fazer os nossos caminhos, a fazer o que
quer que seja que nos faça felizes, a tolerar toda a escolha do outro que o
faça feliz, e a lutarmos para fazer valer as nossas vontades sem deixar que
qualquer coisa ou pessoa interfira nas minhas escolhas ou no que quero ser ou
fazer. Esse mundo também é marcado essencialmente por um abismo de indiferença
entre os seres humanos isolados nas ilhas de suas vidas individuais, por gritos
de pessoas e grupos por mais liberdade, mais expressão, e a hostilização de
tudo que seja contra o que quero ser. Não acho que possamos dizer que o amor
seja a lei que governa, concorda?
Adentremos
um pouco na frase do Dr. Viktor Frankl que eu coloquei acima. A ausência de
amor em que vivemos gera uma situação onde não há entendimento e conhecimento
dos seres humanos por conta da falta da compreensão da essência. Sem amor nós
julgamos as aparências enquanto no amor buscamos essências. Somente através da
lente do amor é que se pode enxergar a essência do homem e perceber a
realização do seu potencial. No mundo onde vivemos, o que se busca é a
aceitação do que é aparente e não a busca do que é real. O mundo se contenta em
olhar a sua aparência e desenvolver leis e conceitos a partir disso, e a isso
nos conformamos muitas vezes, seja por buscar legitimação para aquilo que
queremos fazer ou ser, seja por medo de se confrontar com a verdade. E se eu
aceito viver de coisas que são aparentes, eu me defendo de qualquer coisa que
seja real ou que me tire do conforto das minhas aparências e vontades, afinal,
o que vale é o que eu quero, não é?
No
meio desse mundo e dessa vida, nós construímos uma identidade, planos, sonhos,
relacionamentos, tantas vezes sem saber se estamos construindo a verdade ou
apenas mais uma aparência, mais uma ilusão de satisfação e liberdade. Mas aí
entra o encontro com a vontade de Deus. O encontro com a vontade de Deus é esse
olhar que Frankl descreve: o olhar amoroso que vê a essência. Deus é aquele que
antes de toda a eternidade, já dizia nosso nome (como fez em Isaías 49, 1) e
nos conhecia, que vê em nós tudo que somos e que podemos ser. Mas sem a
compreensão do amor, é impossível compreender a racionalidade de uma vontade
que não seja a minha.
Exemplo disso é quando entramos na
Igreja, quem nunca escutou “ah, mas a
Igreja não deixa você beber”, “a
Igreja proíbe você de ir para a festa” ou mais comumente “a Igreja
lhe reprime! Você é alienado”. Meus irmãos, eu só posso rezar por esse
mundo que é o verdadeiro alienado, alienado da existência de um amor
verdadeiro, carente de essências e contente em ilusões. Mas ainda
assim, nós nos questionamos o porquê de uma vontade que não é a minha, de leis
nas quais eu não votei e de líderes distantes poderem influenciar a minha vida.
Porque precisa ser o que Deus quer se o que eu quero não é errado? Porque eu
não posso saber de uma vez por onde estou indo? São muitos questionamentos (que
eu mesmo já me fiz incontáveis vezes) e que só encontram respostas no encontro
verdadeiro com o amor de Deus.
Ao contrário de uma vontade que é
essencialmente imposta, traçada por um olhar externo e colocada de encontro com
a nossa, a vontade de Deus vem de um olhar de dentro, um olhar que perfura a
alma e nos conhecer por inteiro, busca para nós não a mediocridade das imagens,
mas a plenitude da nossa verdade. A vontade de Deus não é algo que brota da
arbitrariedade, mas do amor, do mais puro e completo amor. Esse amor nos deixou
o caminho da Igreja com a moral e a doutrina, esse amor toca os nossos corações
nas orações, pregações, e nos inspira no Espírito aos caminhos que irão nos
realizar plenamente, indo de encontro não ao meu imaginário, mas penetrando a
minha essência.
Nós é que tantas vezes apegados às
nossas imagens, aos nossos conceitos de liberdade e verdade, aos nossos planos
não entendemos, e nos debatemos contra algo que busca nada mais do que a nossa
felicidade, a plenitude do nosso ser. Nós que temos uma visão não entendemos
quando Deus nos diz “Assim como os céus
são mais altos do que a terra, também os meus caminhos são mais altos do que os
seus caminhos e os meus pensamentos mais altos do que os seus pensamentos.” (Isaías
55:9). Nós não nos conformamos com a lei de Deus porque falhamos tantas
vezes em compreender, depois de tantos anos de pecado, que ela nada mais é do
que a verdade mais íntima circunscrita no meu coração, a minha própria
natureza.
Com isso tudo que expus irmãos, eu
tenho apenas um convite. Não tenhamos medo de abraçar a vontade de Deus, seja
ela qual for e seja qual for os caminhos. Não tenhamos medo de nos afastar das
nossas velhas imagens para abraçar a nossa essência que se encontra nessa
vontade de amor. Nunca será fácil, o mundo (e muitas vezes até seus próprios
pensamentos) irão propor outros caminhos, outras vias, mas somente o amor vê a
essência e é caminho, verdade e vida (Jo. 14, 6). Se abandone, escute a voz do
amor que lhe chama a uma vida nova, a novos caminhos, caminhos de amor e de
felicidade, e não tenha medo de se render. Ele, o seu amado, olha com o amor de
quem sabe quem você é e pode ser. A Ele pertence o seu presente e futuro, e na
vontade d’Ele reside a sua verdadeira felicidade.
Que nesse mundo de aparências e
ilusões nós possamos cada vez mais ser cientes da vontade de amor que nos chama
à essência e a plenitude, ao amor e a felicidade verdadeira. Não tenhamos medo
de seguir o amor e de dizer diariamente o nosso sim!
Doce mistério, cruz e ressurreição
Alegria sem fim
É dor incomparável
é paz profunda em mim
Tua vontade
Jugo suave, chaga que cura
Violência que me faz livre
É caminho certo de felicidade enfim
É amor de Deus
Paraíso, meu lugar seguro
onde vou descansar
Purifica minh'alma
e assim renova o meu amar
Tua vontade em mim é como
um tesouro em vasos de argila
Verdadeira paz que o tempo
e a dor não poderão roubar
(Tua Vontade – Suely Façanha)
Muito bom
ResponderExcluir