(Por Rodrigo
Damasio)
“Princípio do Evangelho de Jesus Cristo,
Filho de Deus” (Marcos 1, 1)
Amados, é com essas palavras que São
Marcos inicia o seu relato da vida de Jesus, imediatamente deixando claro a
base do que se devia apreender da leitura: a filiação divina de Jesus.
Claramente, não sendo um dos doze apóstolos, nós sabemos a princípio que Marcos
não falava de algo que viveu, mas sim formulava em escrita aquilo que lhe havia
sido transmitido, particularmente através do testemunho de São Pedro. Pela
própria natureza da pregação petrina, que se destinou em boa parte aos gentios
e que teve como seu foco Roma, podemos notar um fato fundamental sobre o
Evangelho de Marcos: ele se destinava especialmente aos gentios. Sendo
notoriamente mais curto do que os relatos de Mateus e Lucas, esse Evangelho não
se preocupava com referências as profecias do antigo testamento ou com um
detalhamento muito excessivo, mas sim com aquilo que era fundamental para a
compreensão da pessoa e do ministério de Jesus Cristo.
Nesse sentido podemos dizer que em
larga medida o relato de Marcos apresenta um caráter profundamente
querigmático, focado num primeiro anúncio de Jesus e do Reino, num encontro simples,
mas ao mesmo tempo profundo com Deus Encarnado. Marcos nos coloca de frente com
as duas naturezas que coexistem em Jesus de maneira muito clara, deixando
evidente o seu poder e divindade na realização dos milagres (dos quais 19 são
registrados em seu livro) mas ao mesmo tempo mostrando a face de Deus que
assumiu em tudo a condição humana, que se indignou, se entristeceu, se cansou,
e que acima de tudo amou. Na maneira como Marcos relata a passagem do jovem
rico ele adiciona um detalhe que para mim simplesmente resume toda a pregação
de Pedro e a descrição desse Evangelho, que é a descrição explícita que vemos
em Mc 10, 21 “Fitando-o, Jesus o amou e disse: (...)”.
Essa passagem deixa extremamente
claro que Deus aparece no Evangelho de Marcos como alguém perfeitamente
relacional na figura de Jesus, numa figura onde o olhar de amor precede a
palavra e ao mesmo tempo dá sentido a ela. É interessante porque essas pessoas
a quem essa pregação se destinavam não receberam historicamente anúncios de um
messias que viria, não viviam uma esperança escatológica como a de Israel, e,
portanto, tinham uma ânsia no coração que era completamente diferente, uma
ânsia de amor e de plenitude que não era de certa forma misturada com
expectativas, mas que existia, como existe em todo o coração. A maneira como
Marcos introduz Jesus, sem deixar de fazer referências a aliança de Deus com
Israel, mas inserindo o seu ministério num contexto muito mais humano e
relacional é exemplar para a evangelização contemporânea, uma vez que o
primeiro anúncio deve sempre remeter a pessoa de Jesus em sua essência, para
Deus que sem deixar de ser Deus foi homem.
Isso nos leva a refletir um pouco.
Às vezes a caminhada é tão longa que se vão perdendo as essências, aquilo que é
fundamental. Vamos enchendo os nossos discursos de palavras bonitas, doutrinas
(que são verdadeiras e necessárias) e muitas vezes opiniões e julgamentos
pessoais que nos fazem esquecer que como cristãos nós temos um dever de
evangelizar, de anunciar a boa nova, e esse anúncio é em larga medida, simples.
O Evangelho de Marcos tem somente 16 capítulos (o que o coloca como menor que
os outros). Esses 16 capítulos em seu contexto de Evangelização foram
suficientes para transmitir a essência e a verdade de Jesus Cristo, da sua vida
e do seu amor, da sua figura como manifestação última do amor e da misericórdia
de Deus. Marcos mostra como a Igreja de Cristo, desde seus primórdios,
necessita se adaptar a contextos particulares sem perder a universalidade da
mensagem, ensinar e educar, mas sempre atrair pela essência e simplicidade de
Jesus. Jesus esse que formou, que chamou a um caminho de radicalidade e
diferença, mas que antes de qualquer coisa manifestou amor e misericórdia. O
Evangelho de Marcos é um lembrete para nós que a evangelização brota sempre da
experiência do amado com o amante, do miserável com o misericordioso, do
sedento com a fonte da vida, do homem que se encontra com a essência e simplicidade
da pessoa de Jesus.
Que com o Evangelho de São Marcos e
seu testemunho, nós possamos sempre retornar a essência de Jesus, a experiência
primeira do amor que toca nossas vidas e deseja nos transformar, a visão clara
daquele que foi verdadeiro Deus e verdadeiro homem, para através disso
crescermos no desejo do anúncio desse amor a todos e na vivência da radicalidade
a que somos chamados!
Shalom!
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