Quem és tu, Senhor, e quem sou eu? - Reflexões sobre discernimento vocacional a luz de Francisco de Assis (parte 2)
(Rodrigo Damasio)
"As visitações
extraordinárias que recebera despertaram, em Francisco, um desejo ardente de
estar a sós com o Senhor. Os seus olhos eram poços de nostalgia, a sua alma um
abismo insaciável que tinha um nome: sede de Deus. Quando a alma humana foi profundamente
seduzida por Deus, nascem-lhe asas do tamanho do mundo e, para estar com seu
Senhor, é capaz de transpor montanhas e mares, de atravessar cidades e
rios." Irmão de Assis - Ignacio Larrañaga
Amados, continuamos hoje seguindo
as pegadas de Francisco no caminho rumo a vontade de Deus, a descoberta dessa
vontade que se expressa na vocação. Seguimos com Francisco o caminho do
discernimento vocacional! Nesse caminho que já começamos, vimos que o primeiro
passo é ter um coração decidido por Deus, desejoso da vontade d'Ele, dócil a
sua voz uma vez que se ouve o chamado. Munidos esse coração decidido nós
chegamos a outro aspecto essencial em qualquer discernimento vocacional: a
oração. Toda a experiência com Deus, que já nos levou a nos decidir por Ele, é
uma iniciativa de diálogo da parte d'Ele, que deseja se dar a conhecer e assim
nos fazer adentrar as profundidades da nossa identidade. Considerando que a
nossa vocação é uma parte integral da nossa identidade, é vital a necessidade
desse diálogo amoroso com o Senhor. Vivemos num mundo em que a variedade de
canais de diálogo é bastante grande, somos a geração da internet e dos
smartphones e no meio disso vemos que muitas vezes se perde um pouco da
privacidade, e ouso dizer da sacralidade de determinados assuntos e processos,
entre eles o discernimento vocacional. Em redes sociais e grupos de whatsapp
são tantas "marias" em busca de "josés" (e também o
inverso), tantos aspirantes ao sacerdócio e a vida religiosa que se lançam
prontamente a partilha de tantas coisas e se perdem num mar de palavras e
publicidade acerca da sua vocação que terminam por esquecer de dirigir ao
sujeito primário e privilegiado do diálogo vocacional: DEUS!
Se olharmos para o exemplo de
Francisco, veremos que em larga medida o processo de discernimento foi feito na
solidão com o Senhor, o coração apaixonado e decidido tinha sede de dialogar
com o Senhor e de ser conduzido por Ele. O processo de Francisco foi (e também
o nosso deve ser) permeado pelo silêncio da oração, pela sede profunda de encontrar
Deus, pelo desejo de permanecer em sua presença. Escolhi o exemplo de Francisco
por ver nele de maneira cristalina a primazia da oração, do diálogo entre amado
e amante que nos permite conhecer a nós mesmos e a Deus, que vai nos dando a
capacidade de distinguir com clareza a voz d'Ele em meio a tudo que se levanta.
A nossa vocação, essa parte integrante da nossa identidade, é em todas as
circunstâncias uma resposta ao chamado de Deus, e esse chamado só pode ser
ouvido com clareza no silêncio da oração. Por mais que seja belo tantas vezes
escutar das pessoas que se tem cara de padre, que você e sua Maria são um belo
casal, ou que você daria um ótimo religioso, a sua vocação não é uma resposta a
pensamentos humanos ou mesmo as suas próprias preferências, mas uma resposta ao
chamado de Deus que pode muito bem ser obscurecidos por essas vozes. Dentro do
tempo de discernimento, várias vozes se levantam, sejam no mundo ou dentro do
nosso próprio coração, e a voz de Deus não é clara no meio de ruídos, mas somente
no silêncio da oração.
Francisco
orava questionando "quem és tu, Senhor e quem sou eu?" e nesse
questionamento é que está o âmago da questão do discernimento, saber quem é
Deus e qual a nossa identidade dentro de seus planos. Essa resposta necessita
da disposição ao diálogo, a escuta de Deus que deseja nos falar na oração. E
necessita ainda de cuidado e silêncio, pois é uma questão íntima, parte da
nossa essência, e que dispensa partilhas supérfluas que não irão frutificar em
nada. Necessitamos de silêncio para escutar a voz que não ecoa no nada, mas
ressoa em nossas vidas e nos leva ao autoconhecimento necessário para acolher a
vontade de Deus que há de se materializar na nossa realidade concreta, na nossa
vida cheia de feridas, de debilidades, carências e limitações. A oração é o
nosso instrumento para contemplar sempre a altura de Deus e a nossa pequenez, a
beleza do chamado e a debilidade da nossa resposta, a nossa incapacidade e a
graça infinita que deseja nos capacitar ao que nos escolheu. Qualquer
discernimento vocacional que seja não pode subsistir e gerar uma vocação
fecunda se não for baseado na oração, se não tiver constante a dimensão da
escuta.
Então amados, se vocês como eu
desejam, com o coração decidido, seguir o caminho para a vontade de Deus,
miremos os passos de Francisco e acolhamos para nós o silêncio orante, a via do
autoconhecimento baseado na contemplação de Deus, o desejo de estar a sós com
Deus e o ouvir. Somente com oração constante chegaremos ao discernimento que
nos levará a felicidade da vontade de Deus e a oferta de vida bela e fecunda!
São Francisco de Assis, rogai por
nós para que por meio da via da oração possamos chegar ao conhecimento de Deus
e de sua vontade e também da nossa essência. Que como tu, possamos estar
constantemente no silêncio da oração para ouvir atentamente a voz do Amor que
deseja nos conduzir a nossa essência e a plenitude da felicidade! Amém!
Shalom!
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