“- Dizem que Aslam está a caminho, talvez já
tenha chegado.
E aí aconteceu uma coisa muito engraçada. As
crianças não tinham ouvido falar de Aslam, mas no momento em que o castor
pronunciou esse nome, todos se sentiram diferentes. (...) Ao ouvirem o nome de
Aslam, os meninos sentiram que algo dentro deles vibrava intensamente. Para
Edmundo, foi uma sensação de horror e mistério. Pedro sentiu-se cheio de
coragem. Para Susana foi como se um aroma delicioso ou uma linda ária musical
pairasse no ar. Lúcia sentiu-se como quem acorda na primeira manhã de férias ou
no princípio da primavera. ”
O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa (p.
133)
Amados, uma boa e santa sexta-feira
para todos! Essa parte das Crônicas de Nárnia que iremos ver hoje aparece de
maneira muito breve nos filmes e certamente não nos dá o panorama mais perfeito
dos sentimentos dos personagens. Já sabendo nós que Aslam é uma figura de Deus
na obra de Lewis, esse momento é especial para a história porque é como um
retrato do coração do homem diante do anúncio de um Deus que vem a nós, que
fala muitas vezes mais do próprio homem do que fala de Deus. Nessa passagem eu
vi muito (e tomei muito para mim mesmo) um termómetro do coração humano diante
da vinda de Deus que pode ser contemplado nos personagens essencialmente
separando-os em dois grupos, sendo o primeiro o de Pedro, Susana e Lúcia, e o
segundo o de Edmundo.
Acho
que durante as minhas experiências com Deus algo que ficou bastante claro é que
o homem, mesmo de maneira inconsciente, carrega em si uma sede que só pode ser
saciada por Deus, tem em si a ânsia desse encontro, e principalmente quando
estamos num estado de graça, a mera perspectiva do encontro com Deus evoca em
nós sentimentos positivos. Nessa situação vemos o primeiro grupo das três
crianças. O mero nome de Aslam é suficiente para evocar neles os melhores
sentimentos, aquilo que os impele para Deus, que os guiaria na jornada para o
momento do encontro. Seus corações infantis e puros recebem o anúncio de Deus
que vem com toda a alegria e anseiam por ele, sendo uma demonstração quase
arquetípica do coração cristão desejoso pelo encontro com o Senhor. Tantas
vezes vejo a mim mesmo quando estou esperando por uma adoração, antes da Santa
Missa ou de um momento de oração especial, na expectativa da presença do Amado
que em si só já vai preparando meu coração para o encontro despertando o que há
de melhor na minha essência.
A
reação de Edmundo, por sua vez, é completamente diferente, uma vez que ele já
tinha tido contato com o mal (já estava enfeitiçado pela Feiticeira Branca).
Essa primeira reação de aversão (ou mesmo de medo) é sintomática de um coração
marcado pelo mal e com os valores invertidos, que tentará em seu egoísmo
convencer a si mesmo de que a Feiticeira é boa até o ponto em que se depara com
a cruel realidade. Quantas vezes quando tentamos evangelizar, ou mesmo só
conversar com as pessoas e colocamos o nome de Deus no meio não encontramos reações
similares? Quantas vezes o nome de Deus não é recebido com resistência pode
medo de julgamento e condenação? Edmundo, que sob o jugo da Feiticeira achava
que seria Rei de Nárnia a custo da miséria de seus irmãos, tinha sob si nesse
momento não o julgo de Aslam, mas o da própria consciência que sabia estar
fazendo a coisa errada. Quantas vezes eu também não fui Edmundo, com medo de me
aproximar de Deus, achando que Ele me condenaria, sem saber que quem me
condenava era minha própria consciência diante dos meus atentados a minha
natureza.
Como
não lembrar aqui da parábola do semeador (Mt 13, 3-9), de um Deus que semeia
sua palavra, que se dá a si mesmo a todos, mas que recebe uma resposta
diferente na liberdade de cada coração, que se encontra com uma realidade
diferente? Meu catequista de Crisma muito interessantemente apontou que essa
parábola fala tanto do solo quando do semeador, ou seja, trata-se tanto da
maneira de quem recebe a palavra de Deus como da gratuidade d’Ele que semeia
mesmo diante das realidades adversas, e é interessante ver como a nesse sentido
o Deus que destina seu anúncio a todos, mesmo encontrando resistências.
O
pensamento a que quero conduzir é: quem sou eu diante do anúncio de Deus? Quem
sou eu diante da radicalidade do Evangelho? Quem sou eu diante desse Deus que
está sempre a caminho na minha direção? Como eu o recebo? Esses, de maneira
simbólica, podem servir como um parâmetro, um termômetro para a temperatura do
meu coração diante de Deus. Eu posso, buscando viver aquilo que Deus quer, ser
essa pessoa que recebe com alegria e coragem o anúncio de Deus, permitindo que
Ele desperte em mim o melhor da minha essência. Eu posso ser também essa pessoa
que ou não conhece ao Deus amoroso e misericordioso que é anunciado ou que
insiste em viver as ilusões do pecado correndo para o egoísmo e recebe esse
anúncio ou no mistério do desconhecido ou com o medo do julgamento que vêm não
de Deus, mas da minha própria consciência quando se depara com sua própria
verdade.
Diante
desse anúncio de Deus, das primícias desse encontro de Amor, possamos nós
buscar receber sempre com alegria Aquele que vêm a nós, e que sendo Lúcia ou
Edmundo, sempre virá. Que possamos permitir que o anúncio de Deus que sempre se
renova na oração, na palavra e nos sacramentos desperte em nossos corações os
melhores sentimentos e vivamos para anunciar a todos os que aguardam no
mistério a alegria do amor e da misericórdia que existem na presença de amor do
Leão que se fez Cordeiro!
Shalom!
(R. D - Minions Católicos)
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