Rumo ao país de Aslam: uma reflexão sobre a santidade em Ripchip, o rato falante

“Você não diz nada, Ripchip? – Sussurrou Lúcia.
- Não. Por que Vossa Majestade acha que devo falar? – Respondeu o rato, numa voz que quase todos ouviram. - Os meus planos estão traçados. Enquanto puder, navegarei para oriente com o Peregrino. Quando o perder, remarei no meu bote. Quando o bote for ao fundo, nadarei com as minhas patas. E, quando não puder mais nadar, se ainda não tiver chegado ao país de Aslam, ou atingido a extremidade do mundo, afundarei com o nariz voltado para o leste (...).” Diálogo entre Lúcia e Ripchip em A viagem do Peregrino da Alvorada.

Amados, possivelmente vamos nos aproximando da exaustão da minha inteligência em extrair a sabedoria da obra de C.S. Lewis, mas qualquer reflexão séria da obra não poderia deixar de em algum ponto falar desse personagem cativante que é Ripchip. O corajoso ratinho que acompanha os filhos de Adão e filhas de Eva desde “O Príncipe Caspian” é um espaço amplo de reflexão, seja pela sua coragem inversamente proporcional ao seu tamanho ou pelo seu orgulho que é alvo de uma experiência de humildade tão bela no encontro com Aslam, e hoje o contexto específico do livro é bastante interessante para conversarmos um pouco. Nesse diálogo, nossos amigos se encontram na Ilha de Ramandu (para quem não leu o livro, aquela onde se encontram com a estrela no filme) e descobrem que para quebrar o encantamento dos fidalgos que estavam adormecidos, precisariam navegar até o Fim do Mundo e deixar um de seus companheiros lá (situação que não ocorre dessa maneira no filme, mas existem paralelos). Essa parte da história se dá depois de tempestades, meses de navegação, diversas batalhas e dificuldades e num contexto de exaustão da tripulação, onde poucos queriam ir dali para qualquer outro lugar que não fosse o conforto de suas casas. Todas as condições externas seriam adversas, o desconhecido se encontrava pela frente e na ilha em que estavam, conseguiriam provisões para uma viagem de volta. Muitos inclusive desejavam isso, preferiam o conforto, o seguro, numa viagem que os levaria de volta sem terem chegado ao seu real destino (nem teriam resgatado os fidalgos e nem teriam chegado ao extremo oriente). Nosso amigo Ripchip, obviamente, pensa diferente, e aí nos leva a uma primeira reflexão: a santidade necessita decisão.
Todas as condições eram adversas, mas o personagem nos mostra que nós podemos deixar que as circunstâncias forjem as nossas atitudes ou podemos, com decisão, seguir o caminho da porta estreita. O desejo de Ripchip de ver Aslam, de habitar em seu país, era maior que tudo, e esse desejo é o que norteia a sua vida e as nossas decisões. Nós vivemos num mundo hoje em que a situação pode por vezes ser muito parecida, onde muitos vão questionar a racionalidade da nossa escolha pelo Evangelho, onde as situações poderão muitas vezes nos deixar tristes, desanimados, sem forças, onde as vezes seremos mal compreendidos até pelos que nos amam, mas a questão que nos interpela é precisamente: quão forte é a minha decisão por Deus? Nós contamos sempre com a graça de Deus que deseja estar presente, com o Espírito Santo que deseja guiar nossos passos, com o amor e a misericórdia que constantemente nos amparam, mas se a adesão da nossa liberdade não existe, nós limitamos tudo, escolhemos pelo conforto e não por completar a nossa missão. Uma coisa que eu aprendi durante a minha ainda curta caminhada com Jesus é que eu sempre terei duas opções: eu posso viver uma inconstância eterna nessa vida, buscando as condições mais favoráveis, ou eu posso viver tudo de acordo com a minha decisão por Deus, por viver a santidade. O chamado ao país de Aslam, a eternidade, ecoa no coração de todo homem e mulher, mas é preciso que a escolha por seguir esse chamado seja um fator determinante em nossas vidas, independente das situações com as quais nos encontremos.
Com os planos traçados para a eternidade, é óbvio que o caminho não será fácil, que haverá dificuldades, quedas, e a constante inconstância da nossa resposta, mas se eu não traçar esse rumo, se eu não optar por viver segundo essa decisão, pelo que eu estou vivendo? Será que a minha zona de conforto, que a ausência de julgamento diante de uma escolha diferente, que o meu medo do desconhecido vale mais do que a promessa de eternidade com o nosso Deus? A meta da eternidade necessita da decisão de constantemente se lançar ao mar, de viver no mundo sem ser do mundo, de lutar a cada dia para vencer o pecado com a graça e deixar que Deus me revele a minha verdade. Como diria Moysés Azevedo, requer “coragem, renúncia e disposição”. O caminho para o país de Aslam é forjado pelo sim de cada dia, esteja eu navegando num navio, num bote ou nadando, é pavimentado pela decisão de viver a radicalidade do Evangelho em gratidão pelo amor recebido, e é lugar onde sempre encontraremos no próprio Deus, em seu amor, em sua misericórdia, a força para seguir.
Por fim, um detalhe significante, é que através da decisão, não nos tornamos grandes (vide o tamanho do ratinho cuja alma se projeta para Deus), mas tomamos a nossa humilde posição de pecadores que abraçam a Cruz de Cristo na certeza da redenção. A estatura durante o caminho é sempre a da pequenez, para que resplandeça em nós e seja glorificado Aquele que tudo realiza. O caminho da eternidade, a decisão pela santidade, nada mais é do que a escolha por realizar a nossa essência mais profundo, a busca por constantemente corresponder Aquele que nos amou primeiro e que sempre vem ao nosso encontro. Que mesmo diante do cansaço, das barreiras do mundo e da nossa própria humanidade, nós possamos como Ripchip decidir por buscar a Deus, por realizar a nossa missão e vocação primeira. Que não as circunstâncias, mas a decisão por Deus seja a bússola da nossa vida e nos conduza, cada dia mais, no caminho da santidade!
Shalom!


(R. D – Minions Católicos)

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