Medo de amar

Amados, há pouco tempo atrás conversava com uma amiga sobre um tema muito interessante: ela dizia que começava a amar a Deus mais e mais e que isso a deixava com medo. É um tópico bastante interessante o comportamento do homem diante do amor e do chamado de Deus, pois revela algo muito interessante sobre nós mesmos. Escrevendo em seu lugar decidi escrever para ela (e claro, para todos vocês) sobre esse tema e Deus me inspirou uma passagem para falar sobre isso. Estaremos nos amparando no epílogo do Evangelho de São João, mais precisamente em Jo 21, 15-19.
Nessa passagem nós vemos aquele diálogo tão famoso entre Jesus e Pedro, onde a tripla interrogativa de Jesus e a tripla profissão de amor de Pedro meio que sedimentam o seu chamado a ir à frente da Igreja. Mas é fundamental notar que esse chamado não se baseia em outra coisa senão no amor, e num amor que sempre vai nos levar além dos nossos caminhos e para a vontade de Deus (cf. Jo 21, 18). Pensava comigo mesmo, Jesus precisou perguntar três vezes a Pedro se ele o amava, e nós com muita pressa associamos isso a tripla negação na noite da Paixão do Senhor, mas acho que é mais complexo. O perguntar três vezes faz com que Pedro entre no mistério do amor, vá entendendo (ainda que de maneira muito primária), a entrega que implica esse amor, vá até verbalmente alargando sua resposta até colocar-se completamente diante de Jesus.
Creio que nesse momento com Pedro, Jesus guarda algo para todos nós na medida que vamos nos aproximando d’Ele e do seu amor. É como se começasse devagar na primeira pergunta e fosse adentrando, rasgando o coração, e a cada pergunta buscando uma resposta mais firme, mais decidida. É também uma compreensão da nossa humanidade, de entender que nós somos teimosos de coração e que precisaremos responder muitas vezes essa mesma pergunta. E cada pergunta do amor de Deus esconde tantos detalhes pessoais: tu me amas mais que teus planos? Tu me amas mais do que as tuas ambições e mentalidades? Tu me amas mais do que as tuas seguranças materiais? A cada pergunta a resposta passa a ter um peso maior, a cada pergunta Jesus nos faz amar mais, mas esse medo de mergulhar de cabeça nesse amor que tantas vezes existe em nós não é nada mais do que insegurança, apego, gemidos de uma carne confortável em suas próprias feridas.
Amados, o receio de amar nada mais é do que o receio de sair de si mesmo, de sair dos nossos planos e dos nossos sonhos e entrar na altura dos planos de Deus. O receio de amar não é nada mais do que os gritos do homem velho, da carne ferida, que quando se confronta com o amor que o chama a ir além prefere ficar naquilo que considera seguro, conhecido, naquilo que foi planejado. Enquanto isso a pergunta de Jesus continua a ressoar no nosso coração, tu me amas? Porque se amas, saia! Saia de si mesmo, das suas inseguranças, saia dos seus medos! Se você ainda não consegue aceitar o seguimento irrevogável da vontade de Deus, onde quer que ela lhe leve, pergunte a si mesmo quantas vezes vai ser necessário que Jesus implore pelo seu amor para que você o dê por inteiro? Quanto tempo vai demorar para você entender, que dentro da vontade de Deus, até aquilo que lhe rasga, que lhe violenta e lhe tira da sua zona do conforto é amor? Você está disposto a passar o resto da vida apegado aos seus planos, as suas vontades e caprichos, e nunca descobrir a liberdade do amor?
Amados, o convite da vontade de Deus é um convite a viver de amor, a viver uma vida feliz, fecunda e verdadeira, mas que necessita da minha disposição de, no amor, ir aonde ela me conduzir. Antes de qualquer chamado vem o amor, qualquer chamado só tem sentido quando ancorado no amor, e somente quando o nosso coração se deixa preencher por esse amor é que o Espírito e a Graça são capazes de gerar em nós a disposição de seguir a Deus. Como Pedro afirma a Jesus “Senhor, tu sabes tudo”, podemos nós também dizer em nossa oração “Senhor, tu sabes tudo, tu sabes da minha vida e da minha história, dos meus planos e dos meus sonhos, mas tu sabes também que desejo amar-te mais do que tudo e viver pelo teu amor. Completa com teu amor tudo que falta em mim, Senhor, faz-me livre para amar! ”.
Peço hoje a Jesus, especialmente pela intercessão de Nossa Senhora de Fátima, que tenhamos a coragem e a ousadia de viver por amor, de ir cada vez mais abrindo mão das resistências da nossa carne e nos tornando dóceis a vontade de Deus, seja ela qual for, pois ela é sempre amor e sempre irá nos conduzir a verdadeira felicidade.
Shalom!

“Toda a posse do desnecessário, ainda que seja um alfinete, é um bloqueio para a ação de Deus na alma que se enriquece e se fecha a graça, porque ama mais a si mesma que Àquele de quem tudo recebe” (Maria Emmir Nogueira)


(Rodrigo Damasio – Minions Católicos)

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